Humberto Sinibaldi é criador, ao lado de Dinorah do Valle, do festival de teatro de São José do Rio Preto. Senhor de tal importância para a cultura Riopretense que empresta seu nome ao Teatro Municipal.

Pé – Você pode falar um pouco sobre as origens do festival?

Sinibaldi – A gente tem falado muito sobre como tudo começou, pois o como começou é exatamente a chave do caminho para que estejamos fazendo hoje este festival internacional, na sua 7° edição.

Foi um começo de muita luta na década de 60, quando todo o teatro amador do estado vinha mostrando processos de muita qualidade e tendo um papel importantíssimo na formação de público. Na verdade esse movimento era nacional, mas era São Paulo que liderava.

Existia então, um festival chamado Festival de Teatro Amador do Estado de São Paulo, realizado pelo governo federal através da COTAESP, que era um órgão fortíssimo que representava todas as 11 federações de teatro do estado.

E um grupo de Rio Preto, com a direção de José Eduardo Vendramini, do qual eu fazia parte, ganhou esse festival e foi convidado a representar o estado no Festival Nacional de Teatro Amador de São Carlos com a peça A Mandrágora.

E fomos todos animados, era um grupo jovem, e ganhamos o festival nacional. E essa euforia fez com que nós chegássemos à cidade e fossemos até o gabinete do prefeito. Fomos agradecer, pois ele tinha providenciado o transporte para o festival e, junto com a Dinorah do Valle, na época diretora da Casa de Cultura, pedimos para fazer um festival nacional em Rio Preto. Ele perguntou quanto custaria e eu disse que uns 5.000, não me lembro qual era a moeda da época, e ele topou.

E saímos de lá entusiasmados. Isso era maio de 69 e fizemos o festival em julho. Quer dizer o primeiro festival foi feito em dois meses. Num salão de festas da igreja, pois na época Rio Preto ainda não tinha o Teatro Municipal. E enchemos todos os dias. .

No início era um trabalho de muita raça. A gente arrumava um tanto de carne com um frigorífico, outro dava um tanto de arroz, eu saída de madrugada pra buscar as verduras, a minha mulher, grávida, era quem cozinhava. Mas era um sucesso.

Pé- E o Festival desde então vem acontecendo ininterruptamente?

Sinibaldi – Não. Foram 21 edições, não consecutivas, em 31 anos.

Pé – O que já é uma grande conquista…

Sinibaldi – Pois é, e nessa conquista, o principal eram as atividades formativas, as oficinas que a gente trazia, os debates que eram obrigatórios. E se hoje existe todo esse movimento, isso se deve a meia dúzia de abnegados que lutaram com unhas e dentes pra trazer o festival até 2000, quando virou internacional.

Pé – E qual a função que você exerce hoje no festival?

Sinibaldi –Na primeira, segunda e terceira edição do festival internacional, me reservaram apenas a posição de homenageado. Por que o Secretário de Cultura na época estava querendo negar todo o passado e iniciar uma nova era.

Mas eu me mantinha sempre presente, pois eu sabia que o lugar era meu. E mesmo eles não me dando nenhuma função, eu ficava lá de propósito. Pois eles tinham que me engolir. Aí com a chegada desse novo Secretário, o Pedro Ganga, eu comecei a participar como membro da comissão organizadora. Aí sim eu voltei a ter funções.

Eu sinto que, eu, o Vendra(José Eduardo Vendramini), o Carlos Gardim, nós merecemos esse lugar. Pois nós somos a chama viva desse festival. A nossa energia também está presente. Na verdade, quem segurou o Rojão todos os anos fomos a Dinorah e eu…e o Vendra de longe, pois ele morava em São Paulo. Era a gente que corria atrás de grana, se não conseguisse, a gente tirava do bolso pra ver se recebia mais tarde.

Então hoje eu faço membro da comissão organizadora. E esse atual secretário, exigiu que a prefeitura sempre indicasse dois membros para a curadoria, e um deles é sempre um desses antigos. Esse ano é o Carlos Gardin, o ano passado foi o Vendra e assim vai.

Pé – O Festival, desde que se internacionalizou, vive um outro momento, com um outro porte. Eu quero saber como você avalia esse crescimento e se, inevitavelmente, algo se perde?

Sinibaldi –Sim perde, lógico. Hoje a mídia está muito mais forte, o festival está mais europeu, e perdeu a questão do convívio, do contato, da competição. Eu ainda sou a favor da competição, pois a partir do momento que o festival deixou de ser competitivo, os debates perderam interesse, até dos próprios grupos. E hoje não existem mais no festival. Não é questão da competição com um fim em si própria, mas a competição faz com que o interesse seja maior. Afinal o mundo é competitivo.

Pé- Uma coisa que eu sinto é que os festivais têm perdido sua função de espaço de reflexão sobre o fazer e o pensar artístico, e têm se tornado mais uma vitrine de produtos culturais. Você acha que isso vem acontecendo também em Rio Preto?

Sinibaldi –Tem. Os grupos ficam 4, 5 dias aqui, estão envolvidos com seus espetáculos e não têm tempo para trocar experiências. Hoje o festival traz produções belíssimas, mas acho que falta o eixo, a essência.

Pé- E o que o festival representa para população não artista da cidade? Você acha que ele forma público pra outros eventos de teatro em Rio Preto?

Sinibaldi –Não. É claro que ele gera uma grande expectativa. Tanto é que os ingressos são esgotados muito rápido. Mas passando o festival o público volta a se interessar apenas pelo teatro dos “globais”, pelos grandes nomes. O grupos da cidade tem muita dificuldade de levar público.

Pé- Falando nisso, como você vê a produção local? Você sente que o festival contribui para a melhoria da qualidade do teatro feito na cidade?

Sinibaldi –A princípio, era pra melhorar. Mas a coisa é meio cíclica. Varia muito conforme as gerações que vem se sucedendo. Hoje, Rio Preto tem muitos grupos, acho que mais de vinte, e tem muita coisa interessante, mas tem muita coisa que não dá, há muito equívoco. Acho que é necessária uma reflexão. Pois uma coisa são trabalhos que não agradam a mim ou a você, outra são os trabalhos que são um equívoco completo. E isto aparece muito no teatro infantil. Que é feito sem conhecimento da psicologia infantil, sem apoio de um psicólogo, de um pedagogo. O pessoal acha que teatro infantil é mais fácil e sai fazendo qualquer coisa.

Porém eu vejo que tem muita gente jovem. Eu também comecei muito jovem e acho que teatro só se aprende fazendo e vendo. E no festival a gente tem a oportunidade de ver coisas maravilhosas que se amanhã eu fosse montar um espetáculo, eu teria condição de absorver muitas coisas. Mas pra isso é necessário que se saiba observar, absorver e encontrar formas de aplicar as coisas no seu trabalho.

Pé- Eu recebi um jornalzinho do pessoal de teatro amador da cidade, no qual o eles se mostravam muito insatisfeitos com o festival. Diziam que a prefeitura gasta todo o fôlego nesse evento e não reserva nada para os grupos da cidade. O que você pensa dessas colocações?

Sinibaldi –Eu não vou dizer que eles estão totalmente errados, mas uma secretaria não pode cuidar só do teatro, ela tem que contemplar todas as áreas. E a secretaria daqui tem tentado fazer isso. Tem um prêmio estímulo que dá dez mil reais para montagens. Em março, no aniversário da cidade, a prefeitura abre para todos os trabalhos da cidade, sem medir a qualidade e paga um cachê, pequeno, mas paga.

E, além disso, o festival não é bancado pela prefeitura municipal. A prefeitura dá apenas duzentos mil reais, pro carnaval ela dá duzentos e cinqüenta, quem mantém o festival são os parceiros como a Petrobrás e o SESC.

Pé- Mas você acha que o festival gera na secretaria uma sensação de: Missão cumprida com o teatro, agora vamos se dedicar a outras áreas?

Sinibaldi –Não. A prefeitura sempre é procurada pra ser parceira de outros eventos de teatro, e participa. Por exemplo, na mostra Rio Preto em Cena, acho que é esse nome, a prefeitura cede os espaços gratuitamente. Em janeiro há um evento que são dez dias de teatro infantil a R$1,99, que a prefeitura além de não cobrar pelos espaço as ainda dá uma ajuda.

É que eles não sabem o que é uma prefeitura que não colabora. A gente já chegou a ser escorraçados do gabinete do prefeito sendo chamados de viados, nem homossexuais, viados mesmo. Viados e putas. Isso é que era fazer as coisas na raça.

Pé – E o que você espera para o futuro do festival?

Sinibaldi –O objetivo é sempre fazer melhor, que nunca acabe… Mas não dá pra prever. Quem imaginaria na década de 60 que o festival estaria assim hoje? Mas o futuro do Brasil é de incertezas. O que a gente espera é que não se percam os parceiros, pois sem um ou dois dos parceiros, principalmente os grandes, já fica inviável.

Pé- Pra finalizar…?

Sinibaldi –Pra finalizar eu quero dizer que tudo o que eu coloquei aqui é apenas o meu ponto de vista e que eu respeito profundamente todos que estão fazendo teatro. Por que só quem faz é que sabe das dificuldades.




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